"O pior de se estar morto é que se fica à mercê dos vivos, dos donos dos mortos". Helder Macedo
Não vi ainda ninguém escrever sobre isto, mas tem-me feito imensa impressão a forma como os me(r)d(i)a têm tratado a situação. Ontem, todos os
jornais espanhóis online que li diziam que as cinzas de Saramago seriam repartidas entre Azinhaga do Ribatejo e Lanzarote. Os jornais portugueses mencionavam que o escritor vinha para Portugal, e até houve quem, além de Mário Soares, sugerisse sepultar Saramago no
Panteão Nacional. Cabe na cabeça de alguém que o homem deva ser sepultado em três sítios diferentes? Têm os nossos (des)governantes, que regra geral, não gostavam da visão política e humanista do escritor, alguma coisa de opinar sobre onde ele deverá ou não ser sepultado? Não caberá, porventura, à família (neste caso, à esposa) decidir isso? Não mencionara já
Saramago que queria ser sepultado em Lanzarote, no jardim de sua casa, por baixo de uma pedra?
Ainda ontem
José Sucena, assessor da Fundação Saramago
veio dizer que afinal o
escritor havia mudado de ideias recentemente e que afinal queria ficar só em Portugal. Disse ainda que por motivos particulares
não podia adiantar o porquê de Saramago ter mudado de ideias e decidir, à última da hora, ficar em Portugal. Acrescentou também que Saramago lhe havia dito que
só não deveria ser sepultado em Portugal caso Pilar, sua esposa, mudasse de ideias durante a viagem de avião. What? Não vos soa estranho tudo isto? Então Saramago consentia não ficar mais em Portugal, desde que a sua esposa se manifestasse contra isso quando o avião já estivesse a aterrar em solo português? E não poderia ela manifestar essa vontade em qualquer outro momento? Mas
entretanto os me(r)d(i)a mudaram de discurso. Afinal as cinzas já são para repartir entre Lanzarote e Azinhaga.
Acrescente-se que a viúva do escritor ainda não se pronunciou sobre nada disto e nem quero imaginar a pressão que deve andar a sofrer com toda esta história.
Noto que os jornalistas parecem andar a forçar a opinião pública para que o escritor fique em Portugal. A tonta da jornalista faz perguntas do tipo "Apesar de todas as polémicas e da ida para a ilha de Lanzarote, até que ponto interpreta ou como é que interpreta o facto de
José Saramago querer voltar para Portugal
e deixar expressa essa vontade e de hoje se saber que a Fundação José Saramago indica que o
escritor quererá mesmo que as suas cinzas fiquem mesmo em Portugal?" A "jornalista" realça as polémicas, a provocação do escritor, os ataques à igreja católica, as violações das regras de gramática, de cada vez que vai entrevistar alguém.
Breve resumo da novela:
Dia 18 às 18h - O
corpo de Saramago vai ser cremado em Lanzarote, mas as cerimónias fúnebres vão realizar-se em Portugal. As cinzas do escritor retornarão a Lanzarote, como era seu desejo.